segunda-feira

Zico torce por Adriano no Fla, mas vê dois problemas: cabeça e tendão

 zico especial mosaico (Foto: André Durão/Globoesporte.com)


O projeto de parceria põe no campo da educação de 150 a 300 crianças em cada área escolhida. Na mesa em seu escritório no CFZ, no Rio de Janeiro, Zico exibiu orgulhoso a logomarca Z10, ao lado de miniaturas do seu tempo de jogador. Já são, segundo o Galinho, quase 3 mil crianças atendidas em 10 UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora), indo da Mangueira a São Luiz do Piraitinga e Piquete, no Vale do Paraíba. No bye-bye Brasil, quase 25 mil. O ídolo lembrou: falta ainda o Complexo do Alemão. E se divertiu quando perguntado da escalação do time.


As chuteiras só saem do armário para as peladas. O joelho já não é o mesmo há algum tempo. Mas, à espera de uma entrevista com Zico no CFZ, percebe-se logo: fora de campo, continua o fominha - no bom sentido - dos tempos da camisa 10 rubro-negra. Dita o jogo nos mínimos detalhes. Alegra-se com o coco a ser levado para casa, marca o conserto de uma tubulação, preocupa-se com as meias do time do filho Junior, vibra com a chegada de mais um neto, providencia um cafezinho e pede a lavagem do uniforme do Zico Escola 10, equipe montada para exibição em locais que recebem a nova escolinha do Galinho.

- É uma seleção. Marcelo Leite no gol, Leandro Ávila, Junior Baiano, Edinho e Jorginho Paulista (ou Athirson); Valber, Djair, Beto (sem cachaça) e eu; Thiago e Claudio Adão. Tem ainda Sorato, Donizete, Gelson Baresi. Aílton, uma galera legal...

Na seleção dos peladeiros, Zico coordena, orienta, joga. Fora de campo, virou torcedor nas horas vagas do comando do Iraque. Torce para Carlos Alberto Torres, o capitão do tri, assumir a presidência da CBF, após 23 anos de poder de Ricardo Teixeira. Otimista em classificar o Iraque para a Copa do Mundo no Brasil, elogia a atuação do ex-desafeto Romário como deputado federal. No coração rubro-negro, mesmo magoado com a política do clube, Zico torce também para Adriano, outro homem-gol, dar a volta por cima no Flamengo. Mas vê duas dificuldades pela frente.
- Primeiro tem que recuperar o problema do tendão de Aquiles. Não adianta recuperar a cabeça se não recuperar o tendão. Agora, são dois problemas, e graves. Eu, como amigo e fã, torço para que consiga isso (...) Na vida todo mundo merece outra chance. Eu sou suspeito pra falar porque gosto muito dele. Como torcedor, como amigo... Acho que o Adriano é um cara decisivo. Até já disse isso, mas vou repetir: é o único jogador, a meu ver, que poderia ganhar a Copa para o Brasil. Mas já vi muito jogador ter problema no tendão de Aquiles e depois sofrer com a recuperação..
Ex-diretor de futebol do Flamengo e atualmente rompido com a presidente Patrícia Amorim, Zico afirmou que não há a menor chance de ser candidato ao lugar dela em uma chapa organizada por Marcio Braga. Recordou-se de história do tempo de jogador com o querido amigo Chico Anysio, que deixou o país mais triste com sua morte em 23 de março. E sobre as vaias da torcida rurbro-negra a Ronaldinho Gaúcho, lembrou conselho recebido quando jovem por um conhecido Mestre Ziza, um dos maiores medalhões da história do clube e do futebol mundial, e a postura de um certo Deus da Raça.

- A torcida do Flamengo sempre foi assim. Eu também fui vaiado, no início da minha carreira, em 1976. Ela quer empenho,  luta. Você pode não estar jogando nada, mas exige que você sue a camisa, brigue... Isso eu aprendi com o Zizinho. Certa vez, ele me disse: "Tem dias que a bola não dá legal, bate aqui, bate ali, quica, vai na canela. Então, meu filho, sai correndo que nem louco lá dentro do campo, briga, que daqui a pouco você entra no jogo."  É só lembrar do Rondinelli, a raça com que ele jogava... - afirmou o Galinho, torcendo para R10 ser feliz no clube com a mesma camisa que o consagrou.
Abaixo, veja a entrevista.

GLOBOESPORTE.COM: Está otimista com a classificação do Iraque para a Copa de 2014 no Brasil?

Zico: Estou, sim. Muito. Acho que dá.

Qual é a grande dificuldade?
Eles não jogam um campeonato competitivo, né? Os jogos de eliminatória é que são fortes mesmo... Dois jogadores atuam no Irã... No Irã é mais forte. No Qatar, o campeonato não é tão forte. No Iraque, é muito fraco.

Lá no Iraque, você recebeu críticas por não ter ido a Bagdá...
Mas não dá para ir. Quando vou, tem que ter carro blindado, vidro fumê, segurança, helicóptero. Imagina uma pessoa normal... Reclamam que eu não vou e não jogo lá, mas lá não tem CT, estádio em condições, a Fifa proíbe jogos. Mas esse tipo de coisa eu só falo em entrevistas ao vivo, para que não peguem só uma frase e as minhas declarações sejam deturpadas. A imprensa criticou uma vez quando eu disse que jogaria pelo empate porque só precisava de um ponto para garantir a classificação. Cobram que tem de vencer sempre. Mas quando demos uma goleada de 7, não apareceu ninguém na coletiva. Nenhum repórter. Só vão quando é para criticar.

E o próximo grupo, que tem Austrália e Japão?
É complicado, mas o outro é mais perigoso. Estou otimista.

Sobre a volta de Adriano ao Flamengo... Você lhe daria nova chance?
Se ele não tivesse tido o problema do tendão de Aquiles, eu o traria para fazer uma tentativa. Ele só com o problema do peso. Essa questão do tendão... Isso é uma coisa muito séria. Você tem que availiar, porque agora não é só a questão de recuperá-lo na parte profissional. Tem que recuperar da parte do atleta. Na vida todo mundo merece outra chance. Eu sou suspeito para falar porque gosto muito dele. Como torcedor, como amigo... Eu acho que o Adriano é um cara decisivo. Já disse isso, quando o Corinthians o pegou, mas vou repetir: é o único jogador, a meu ver, que poderia ganhar a Copa para o Brasil. Mas antes de ter o problema do tendão de Aquiles. Já vi muito jogador ter esse problema no tendão de Aquiles e depois sofrer com a recuperação. O tendão de Aquiles é o peso. Por que está surgindo essa história de "vai operar de novo"? Tem que ver isso. Em 2006, quando teve aquela história de acharem que Adriano e Ronaldo não poderiam jogar juntos, eu falei: "Pô, manda um pra mim, aqui no Japão!"

Como avaliou a postura dele no Corinthians de não se tratar direito? De ter faltado a 67 sessões de fisioterapia?
Claro que isso não foi legal. Se não fosse contra isso, seria contra tudo que apregoei e sempre fiz como profissional. Esse tipo de conduta não é bom nem pro Adriano nem pra ninguém.

Ainda há jeito de se mudar isso?
É muito difícil. Mais do que há quatro anos. Primeiro, tem que recuperar o problema do tendão. Não adianta recuperar a cabeça se não recuperar o tendão. Agora, são dois problemas, e graves. Eu, como amigo e fã, torço para que ele consiga isso. É a força de vontade que conta. O cara querer. Tudo isso que fala, apregoa... Gosta do Flamengo, se sente bem no clube... Se quer mais uma oportunidade, é a hora.

O apoio da torcida ajuda?
Ajuda, e muito. Dá uma tranquilidade grande. Mas hoje, o maior problema é a contusão. E quem está lá é que vai decidir.

Agora, a paciência que a torcida mostra com o Adriano não é a mesma com o Ronaldinho, vaiado algumas vezes...
Mas a torcida do Flamengo sempre foi assim. Eu também fui vaiado, no início da minha carreira, em 1976. Ela cobra empenho,  luta. Você pode não estar jogando nada, mas ela quer que você sue a camisa, brigue... Isso eu aprendi com o Zizinho. Certa vez, ele me disse: "Tem dias que a bola não dá legal, bate aqui, bate ali, quica, vai na canela. Então, meu filho, sai correndo que nem louco lá dentro do campo, briga, daqui a pouco você entra no jogo. Ele era treinador do América. Eu ia lá, tinha 15, 16 anos, foi ele quem inventou o número 1 no meio-campo, no América, com o Edu. E me dizia. "Olha, joguei lá, vai pensando nisso. Flamengo é isso, é aquilo..." E também é só lembrar do Rondinelli, a raça com que ele jogava.

Falta isso ao Ronaldinho?
Ah, não sei, não estou aqui para julgar ninguém. O que estou dizendo é que o Flamengo é assim. Eu torço para que ele seja feliz no Flamengo. Para que devolva o investimento feito por ele. A recepção da torcida do Flamengo mostra isso. O esforço da diretoria para trazê-lo foi muito grande. O mínimo que você pode dar é tentar corresponder dentro do campo. E tem que responder com atos jogando bola e com atos como profissional. É isso que a torcida só cobra.

Qual a sua opinião sobre a cartilha feita pelo Jairo dos Santos aos jogadores, que a fizeram virar uma gaivota de papel?
No mundo de hoje que a gente vive, qualquer coisa feita assim só vai servir para motivo de piada. Só o fato de já ter um negócio desse... No Brasil estamos muito atrasados nisso. Muito. Uma das coisas que eu conversei no último almoço com o Ricardo Teixeira foi justamente isso. Queria saber por que estávamos tão atrasados, essa coisa de o Brasil precisar ficar concentrado 50 dias. A Holanda, que estava com todas as suas mulheres na última Copa, saindo, passeando, chegou lá e ganhou. Expliquei para ele que o Flamengo com o Carlos Alberto Torres como técnico, em 1983, chegava meio-dia na concentração para jogar às cinco da tarde. Ia lá e ganhava. Enquanto você não der responsabilidade aos jogadores, tratar o jogador que nem criança, ele não vai saber fazer nem o check-in.

Sobre a garotada do Flamengo, com Muralha, Luiz Antônio, Thomás... O que está achando?
Em alguns casos, como o do Thomás, o lançamento está sendo prematuro. Mas a garotada é boa, acompanhei de perto quando estava lá. Ainda tem o Adryan, o Rafinha, que teve o problema da fratura...

E a mágoa da diretoria do Flamengo. Passou?
Claro que não! Como passou se ainda sou alvo de uma investigação no clube?

O Marcio Braga quer uma frente que apoie o seu nome para disputar as eleições para a presidência...
Sem chance. Em nenhum momento ele falou disso comigo. Não fui consultado em nada. Fiquei sabendo pela imprensa. Tenho contrato com o Iraque até 2014 e existe um planejamento para continuar até 2018.

De uma presidência a outra... Vê alguém capacitado para a da CBF? E esse movimento de ex-jogadores? O Ronaldo já falou que aceitaria, o Paulo André...
O Carlos Alberto Torres é um nome forte. Pela experiência dele aqui, no exterior, personalidade forte. O Ronaldo, por enquanto, é pelo nome, não pela experiência que tem. Acho que tem que ser alguém do futebol. Se puder, com experiência em outro setor. Administração, presidência, diretoria... E conhecer ali os métodos. O importante na CBF é saber delegar poderes. Em cada área você não entende de tudo. Só  acho que, em todo movimento a respeito de futebol, se pensa no ex-jogador. Futebol não é só ex-jogador. Tem ex-preparador físico, ex-técnico, ex-médico, ex-fisioterapeuta. Sempre critiquei na CBF - e não foi agora, que o Ricardo está saindo, há muito tempo fazia isso e fui muito criticado - ela ser uma entidade do futebol e não ter ninguém do futebol lá dentro. Numa entrevista, o Andrés (Sanches) disse: "Pô, vamos entregar isso para quem não é do futebol?" Pô, mas quem está deixando não era do futebol!. E ninguém pergunta isso... O cara que ficou 23 anos não era do futebol e ninguém diz isso! Tem um monte de vice-presidentes, mas sempre da política. O vice-presidente pode até ter passado pelo futebol, mas é político.

O Marín foi jogador mas não está lá por ter sido jogador...
Passou pelo futebol, mas foi governador (de São Paulo). Assim como o Nabi Abi Chedid... Então, eu acho que não é o caso de ter um cara jogador, mas do futebol. Não tem isso lá. Quando fui secretário, a única entidade que não me apoiou lá foi justamente a do futebol. E o trabalho que eu fiz, e graças a Deus deu certo, não visou ao futebol, mas ao esporte. Na natação, tive a maior vitória. Foi o esporte que mais desenvolveu. Ficou com o primeiro patrocínio que eu consegui, o dos Correios. Direto. Coaracy Nunes fez um belo trabalho, com muitos recordes e tudo. E sabe como começou isso? O presidente dos Correios era Flamengo doente. De repente, me chamou lá e disse o seguinte: "Olha só, com tantas alegrias que você me deu, quero te ajudar em alguma coisa. No que posso te ajudar?" Na mesma hora, liguei para o Coaracy e pedi para ele ir a Brasília acertar tudo. E o Coaracy era aquele presidente que me ligava todo dia...

Você não se vê na presidência da CBF?
Eu não. Capacitado eu estou. Mas não me vejo nessa função. Depois que acabar meu tesão pelo futebol, pelo profissional do futebol... A prole está crescendo. Tenho que ficar com eles. Estou cada vez mais dedicando meu tempo à família. Aliás, vocês vão ficar sabendo... Vou ser avô de mais um...

Existe uma preocupação sua, antiga, com os atletas e ex-atletas de futebol...
A gente está reativando a Agap. Tivemos um encontro com o Eduardo Paes. Isso foi deixado às traças. Agora, com o Deley e o Romário lá...

Como avalia a atuação do Romário como deputado?
Ele tá legal, fazendo o trabalho dele. Eu o esperava atuante, como está. Crítico... Pode até pagar um preço alto por isso. Passei por essa situação como secretário, vi de perto. O cara estando atuante vê as coisas. E não tendo o rabo preso com ninguém, expõe. Pode ser prejudicial para a hora que precisar de alguma coisa lá na frente, esses caras monopolizam demais, têm aqueles grupos... Mas acho que algumas das críticas que fez foram pertinentes, de coisas que só quem está lá dentro pode falar com mais segurança.

Considera a saída de Ricardo Teixeira um divisor de águas do futebol brasileiro?
Não vejo isso não. É uma oportunidade, daquilo que eu disse, da transparência. Acho que o Ricardo já estava começando a querer fazer a transparência. Viu que, com tudo o que fez, acabou ficando sozinho. Aquela velha história: enquanto está bem, com o poder, todo mundo fica do seu lado. Quando começa a perder um pouquinho, os caras começam a te deixar sozinho. A gente na vida está sempre aprendendo. Dava para sentir, de uns anos para cá, a fisionomia cada vez mais cansada, mais entregue, mais triste. Ele viu que essas coisas todas... Acabou tendo que se comprometer com um monte de gente... Você não pode ter uma entidade rica e os clubes de pires na mão.. Fico à vontade para falar porque fui o primeiro a contestar isso desde que começou a Copa do Brasil. É uma competição importante. Mas da maneira que começou... Era um caça-níquel. A gente ia para Blumenau, saía seis horas da manhã, chegava no Rio às nove da noite. Aí falei: "Vem aqui ver o que é bom!" Muitas mudanças foram acontecendo graças a isso.

O país perdeu recentemente um dos homens mais brilhantes e inteligentes, e você perdeu também um grande amigo. Fale-nos um pouco de sua relação com Chico Anysio.
Chico não era só um ícone e craque no humor, mas também escrevendo, comentando, compondo. Era um artista completo. Seus mais de 200 personagens nos divertiram muito. Ele foi um amigo que fiz. Por muitas vezes eu e boa parte dos jogadores do Flamengo íamos aos shows dele. Eu tinha um desses em fita. No tempo em que morei no Japão, eu, Sandra e meus filhos não perdíamos a "Escolinha do Professor Raimundo". Recebíamos com uma semana de atraso os episódios e adorávamos matar as saudades. Estamos todos em casa muito tristes com a sua morte. Vou guardar dele boas histórias e lembranças.

Conte-nos uma das boas...
Quando ainda era um menino, o Bruno Mazzeo, filho dele, me ligou pedindo jogos em fitas para poder treinar narração. O sonho dele era ser locutor. Separei um monte de jogos e dei a ele. Isso me aproximou mais do Chico. Pouco depois ele me ligou agradecendo e queria me presentear. O encontro foi marcado num dia de jogo do Nova Geração. Chico me levaria o quadro que ele pintou e nós poderíamos conversar sobre futebol. Na noite anterior, recebi uma ligação estranha de mulher com sotaque nordestino. Aí, entrou na linha meu compadre Fagner para explicar: a mulher era um jovem humorista cearense me gozando. Chamava-se Tom Cavalcante, talentoso. O Fagner queria apresentá-lo ao Chico. Falei que ele iria ao jogo do Nova Geração. Assim, promovi o encontro entre Chico e Tom, que em seguida foi trabalhar como assistente de Painho, antes de estourar como João Canabrava. A parceria durou muitos anos, e o Tom Cavalcante acabou se tornando meu amigo também.

Tem história relacionada a futebol?
Sim. Primeiro o Chico foi torcedor do América, e adorava o meu irmão Edu. Depois, virou casaca e passou a torcer pelo Vasco. Muita gente não sabe, mas aquele Flamengo e Vasco do Bujica, em 1989, teve muito a ver com ele. Num comentário para a tevê, disse que aquele Flamengo era um time velho para o Vasco, que tinha Mazinho, Tita, Bismarck, Bebeto e ainda meu ex-companheiro Andrade. Usamos a declaração dele para nos motivar e deu no que deu. Vencemos por 2 a 0 com dois gols do Bujica. Confesso que naquela ocasião fiquei chateado com o Chico, mas depois eu percebi que pesou o coração vascaíno que ele tinha. O Chico vai fazer falta até pelas polêmicas...

 Fonte: GloboEsporte.com